quinta-feira, 28 de maio de 2015

Que coisa linda este depoimento!

Que coisa linda este depoimento!!! Os nomes foram omitidos para evitar a exposição dos personagens desta linda história.
"Bom dia senhor Egidio
Estou feliz por ter lido seu livro, ele me ajudou a abrir os olhos para a difícil realidade dos petizes que estão à solta em nossas cidades, jogados à sorte (ou ao azar). Seu livro me fez lembrar de um garoto que certa vez conheci rondando o aeroporto de Congonhas. Era um menino negrinho com uns sete anos de idade, era um dia frio e ele estava só de camisetinha surrada, cheia de buracos, calção e um tênis muito desgastado. Eu estava esperando minha filha me buscar e ele se aproximou com o rostinho sujo, ele era tão magrinho que imaginei que mais um pouco ele seria apenas um feixe de ossinhos miúdos. Ele chegou perto de mim e me chamou com os braços escondidos dentro de sua camiseta, batendo os dentes. Eu logo imaginei que ele pediria dinheiro ou comida, mas não, ele me pediu uma blusa, pois eu estava com uma blusa avulsa na mão, além do pesado casaco que eu vestia. Olhei para ele e senti seu sofrimento. Se fosse meu filho eu jamais deixaria passar frio. Peguei minha blusa que comprei na Europa e falei para ele vestir, cabia mais uns três daquele menino ali. Mesmo correndo o risco de saber que ele poderia não estar ali, disse a ele que se esperasse eu compraria algo para ele comer e uma blusa mais apropriada para o seu tamanho. Ele disse que sim com a cabeça e ficou sentadinho me esperando. Comprei uma blusa que lhe caberia com mais precisão, uma calça jeans, um par de meias, quatro salgados e um copão de chocolate quente. Pensei que não o encontraria, mas ele sequer se mexeu, diferente de nós que não confiamos em ninguém, ele confiou e estava ali. Primeiro eu lhe dei a blusa, seus olhos brilharam como duas estrelas em meio à escuridão. Ele a retirou com todo o cuidado e pediu-me desculpa. Perguntei por que e ele respondeu que era porque ele estava sujo e devia ter sujado minha blusa. Eu disse que não era para se preocupar, e ele perguntou se eu não tinha nojo dele. Senti-me mal, imagino como ele se sentia e como era tratado. Em seguida eu o ajudei a se vestir, o frio não ia mais castigá-lo tanto quanto estava castigando. Ele colocou a blusa com um sorriso iluminado, tirou o tênis, calçou as meias, colocou a calça por cima do calção e ficou me olhando. Lembrei-me do que eu havia comprado para ele comer e beber. Eu jamais havia visto alguém tão faminto, em poucos minutos ele comeu tudo, mas o chocolate quente, este não, ele bebeu devagarzinho. Perguntei se estava gostoso e ele disse que sim, que estava esquentando suas mãos. Aquela criança estava me dando uma enorme lição de vida. Por fim decidi perguntar sobre a família dele e ele levantou os ombros como se disse que não sabia. Foi doloroso ver que esse laço de ternura não existia. Perguntei se ele tinha pai, ele respondeu que não, perguntei se tinha mãe ele apenas sinalizou que sim com a cabeça. Pouco depois minha filha chegou. Eu pedi para o garoto nos acompanhar e perguntei onde a mãe dele estava. Ele nos levou a uma toca embaixo de um dos viadutos da região, pedi para minha filha estacionar e ao garoto para chamar sua mãe. Pouco depois a mulher chegou, parecia drogada, olhei seus dedos e vi as queimaduras típicas dos usuários de crack. Apesar da dificuldade de se comunicar pedi a ela se me daria a guarda do filho para que eu cuidasse dele. Ela simplesmente fez um gesto com a mão como se dissesse “leva embora”. Disse a ela que conversaria com meu advogado para regularizar o processo. Eu me abaixei e falei com o menino se ele gostaria de morar com a minha família, ele pulou no meu pescoço e me deu um abraço tão forte que não precisou de mais nada. Pedi que ele ficasse com a mãe e que logo eu estaria ali para ajudá-lo. Dei duzentos cinquenta reais para a mãe e disse que era para alimentá-lo, sei que boa parte ela deve ter usado com drogas, mas creio que seria o suficiente até que eu voltasse com uma caixa de mantimentos. Dias depois já dávamos entrada na solicitação da guarda do menino. Passaram cinco anos desde então, há três anos o garoto vive com a minha família, ele está na escola e recuperou o direito de ser criança. Sua educação é exemplar, ele nos respeita bastante, mesmo sendo adotivo. Sentimos a gratidão. Curiosamente, foi ele que me deu seu livro, ele usou o dinheiro da própria mesada para ir à livraria e comprar seu livro. No começo do mês recebi o livro Pinóquio do Asfalto de presente de aniversário junto com um cartão que dizia: Pai, essa é a nossa história, você me fez um menino de verdade. Tem como não chorar?
J.C.A."
Simplesmente não tem como não chorar!


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