terça-feira, 25 de novembro de 2014

Depoimento

Nosso querido autor, Professor Egidio Trambaiolli Neto recebeu mais m depoimento sobre o sucesso do livro "Pinóquio do Asfalto", confira:
"Senhor Egidio
A vida na rua não é fácil. A gente já nasce com o rótulo de bandido, mesmo não sendo. Eu perdi dois irmãos em uma chacina, destas que a polícia faz para tirar pessoas como nós das ruas. Às vezes, a gente dá sorte, às vezes Deus dá uma olhadinha para a gente que vive na rua e resolve dar uma oportunidade. Eu mesma acabei me casando com um homem simples que trabalha em uma casa de materiais de construção. Foi ele que me tirou da rua. Na época da chacina dos meus irmãos, que não eram bandidos mas conheciam bandidos, eu muito fiquei assustada, eu achei que ia morrer. Eu me lembrava daquilo que o povo dizia: diga com quem anda e direi quem você é. Acho que por isso a polícia matou meus irmãos, um deles dizia que ele tinha que ser amigo dos marginais para proteger a gente, ele morria de medo que eu fosse estuprada. Talvez seja porque nossa mãe era uma prostituta e fazia filho direto, acho que viemos ao mundo como um castigo pra ela, meus irmãos morreram pra que ela sofresse, mas acho que não adiantou, não sei por onde ela anda. Ela sumiu. Meu marido é um homem muito bom, ele me ajudou a tirar documentos, me levou pra escola de EJA e eu estou terminando de estudar. Minha professora que me ajuda a escrever bem porque eu ainda faço muitos erros. Sou grata a ela por isso. Nesse mês ela passou pra gente ler alguns livros e eu escolhi o Pinóquio do Asfalto. Fiquei emocionada, chorei muito com a história do pequeno Marcio. Era pra gente ler só um capítulo e mesmo com as minhas dificuldades eu quis ler o livro inteiro. Minha professora falou para nós escrevermos para os autores contando um pouco da nossa história e eu estou aqui fazendo isso, mesmo com muita vergonha porque eu sou pobre e não sei escrever direito. Seu livro está com um outro aluno agora, ele também viveu na rua quando foi abandonado. Espero que o livro ajude esse meu colega de classe também a ver como tem gente que tem bom coração. Eu acho que você é igual essas pessoas que só faz o bem, você tinha que ganhar um prêmio Nobel da paz."
Maria S. Silva


terça-feira, 18 de novembro de 2014

Depoimento anônimo

Recebemos mais um depoimento emocionante, motivado pela postagem de Luan Paganarde que contou um pouco de sua história. Assim, um rapaz que não quis se identificar, mas procurou desabafar, relatou a sua sofrida vida e a relação estreita com a história do livro Pinóquio do Asfalto:
"Quero aproveitar para falar também da minha infância. Eu gostaria de deixar meu nome, mas eu tenho medo, porque eu passei um bom tempo nas ruas. Minha mãe, pelo que contam, era viciada e engravidou não se sabe de quem e me colocou no mundo. Na realidade ela me largou no lixo e fui encontrado em uma pilha de lixo na região da estação Armênia do metrô. Quem me encontrou foi uma moradora de rua que morava em um prédio abandonado junto com mais um monte de gente e ali fui crescendo. Quando eu tinha cinco anos, a polícia fez com que todos que moravam ali fossem jogados na rua porque o dono do prédio queria desocupar o lugar. Fiquei por três anos passando fome, frio e raiva embaixo de viadutos, onde respirávamos gás de escapamento de carros. Minha mãe acabou pegando pneumonia e morrendo, eu fiquei sozinho de novo. Foi aí que me juntei a outros meninos para fazer o que não podia, não devia. Um homem que tinha três filhos me levou para matricular na escola, mas eu não tinha documentos. A escola me ajudou, lá tinha comida, fui aprendendo a escrever e ler, mas na rua aprendendo a usar drogas, roubar, a machucar pessoas e fazer sexo por dinheiro. Infelizmente tem gente que só quer fazer sexo com crianças. Eu também comecei a fazer sexo com outras crianças, isso era comum com a gente. Depois de um tempo, quando eu já tinha 13 anos engravidei uma menina que era mais velha que eu e vivia aparecendo na cracolândia, ela não morava na rua, mas foi tirar a criança e morreu por causa do aborto. Tinha um padre que me ajudava, dava comida quando eu não ia na escola. Quando a polícia chegou na cracolândia eu apanhei muito. Ficamos rondando na cidade como zumbis dos filmes que eu via da porta das Casas Bahia, sem saber pra onde ir. Depois de uns dias que a cracolândia acabou, eu roubei comida em um supermercado, apanhei dos seguranças e fui detido na Fundação, até que eu fiquei de maior. Hoje quem me ajuda é o mesmo padre que me ajudava antes e algumas pessoas da igreja, esta carta foi uma senhora da igreja que me ajudou a escrever comigo, ela corrigiu meus erros, porque ainda não terminei a escola. Ela tem um bom coração. Ela digitou para mim. Foi ela também que comprou seu livro e me ajudou a ler, porque eu não sei ler muito bem, tem palavras que são difíceis. O padre e o pessoal da igreja estão me ajudando, acho que é por isso que dizem que a igreja é a casa de Deus. Aqui eu me sinto um menino de verdade, um homem de verdade, e sei que se Deus me colocou no mundo e se a minha mãe me colocou no lixo, aqui eu posso voltar para o mundo com a ajuda dessas pessoas que têm Deus em seu coração e por um escritor tão fantástico que é você, que escreveu Pinóquio do Asfalto para que o mundo olhe para nós, que veja como é a nossa vida. Nós só queremos ser amados. Não temos culpa de mães que abandonam, de pais que não conhecemos ou de qualquer tipo de pessoa que não nos queiram bem, como os policiais que vivem batendo na gente sem mais nem menos. Eu sei que fiz coisas muito errada, na igreja eu larguei as drogas, pedi perdão pela pessoas que machuquei com a minha faca, sei que ninguém morreu, mas eu fiz essa maldade e não vou fazer nunca mais. Deus está comigo! Rezo sempre para ajudar as outras pessoas que vivem na rua, os novos Pinóquios que nascem todos os dias. E rezo para que neste mundo outras pessoas olhem pra gente como você fez."
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